9/19/2006

Universo Paralelo

- Eles estão me seguindo! – gritou ao médico.
- Eles quem? – perguntou o especialista com paciência.
- Os iguais ao senhor, mas de outro tipo – declarou com perplexidade.
- Que tipo?
- Daqueles que cortam o cérebro para estudos.
- Eles querem cortar seu cérebro?
- Sim.
- Por que?
- Descobriram meus segredos e querem estudar como eles foram arquitetados pela minha mente.
- Você pode os contar para mim?
- É claro que não! – disse impacientemente – O que posso dizer é que tratam de segredos sobre a essência humana – completou o paciente.
- Como o descobriu? – replicou o médico.
- O caminho não lhe posso descrever. É por isso que querer me cortar o cérebro, para descobrir como as sinapses ocorrem e produzirem outros iguais a mim. Formar uma nova sociedade cujo princípio estará pautado na própria essência do homem, mas eles não percebem...
- Percebem o quê?
- Você está indo longe demais. O que de fato quer saber? Não confio em vocês. São todos iguais!
- Pense comigo – convidou o médico – isso não seria bom. Saberem como chegar à essência humana e construir seres humanos melhores.
- Você não entende... está preso ao paradigma. Vive cercado por ele e não consegue sair para ver além do seu mundo interior. Não consegue fazer as conexões entre as informações e a realidade. Só vive de informações vazias e sem sentido para vida real. Mas eu lhe entendo, aliás, também tenho que fazê-lo. Caso contrário, não suportaria viver na essência. É perigosa!
- Por que é perigosa?
- Ora, por si própria. Você conseguiria suportar saber quem é você e qual o seu destino? – disse ao paciente com displicência.
- Mas não é esse o objetivo da nossa existência? Saber quem somos e para onde vamos! – retrucou o médico com convicção.
- És ingênuo! Se soubesse o que sei nunca diria isso.
- O que te faz pensar que só você sabe disso e que não pode contar a ninguém?
- É exatamente isso, contar deixaria de saber, o que acarretaria grandes desastres para todos. Inclusive para o senhor – disse essas últimas palavras olhando-o fixamente nos olhos.
O médico sentiu-se penetrado por aquele olhar. Ficou inibido e pôs se a olhar para os papéis que estavam sobre a mesa. Ficaram ambos em silêncio por alguns segundos que pareceu uma eternidade. O médico interrompeu aquele silencio com um rosnar e declaro desconcertado que a seção havia terminado. No entanto, ele próprio não percebera que Roberto havia deixado implícita a explicação da própria essência que havia descoberto em seus devaneios.
Roberto deixou o consultório, as indagações ainda continuavam nos pensamentos do médico. Não conseguia deixar de pensar o que Roberto sabia ou acreditava saber. Sentia que havia algo de sincero e importante, no entanto, sabia que tudo poderia ser uma ilusão que Roberto criou para conseguir viver em sociedade. Sentia que algo em seu íntimo estava em sintonia com os sentimentos de Roberto, mas não conseguia descrevê-los ou interpretá-los de maneira racional. O que mais o instigava é que Roberto destruiu todos os valores e concepções que havia construído durante sua vida. Aliás, este foi o principal motivo que o levou ao seu consultório, pelo aparentemente. Lembrou-se do primeiro dia que Roberto apareceu em sua frente. Estava em pleno desespero e tentava aceitar as convicções que ele próprio destruíra. É claro que teve essa noção com o passar do tempo, mas naquele momento parecia que Roberto estava anunciando que algo de importante aconteceria. Tentou lembrar o que era, mas não conseguiu. Pegou o histórico e foi para primeiro dia de atendimento:

14 de maio de 2000 – Roberto Fantine apresenta sintomas proféticos. Declara que descobriu algo de importante sobre o homem e que um desastre está prestes a acontecer. Falou da morte de milhões de “partículas” e que as viu em um sonho. Há séria possibilidade que tal sonho tenha sido alucinação, pois não dorme há dois dias seguidos e disse que o ocorrido foi durante esse período. Encontra-se em desespero.

O médico tentou lembrar de mais alguma informação que ajudasse a entender o desenrolar da história. No entanto, estava cansado e não conseguia mais pensar.

***

Roberto saiu do consultório e foi caminhar pelas ruas. A maior parte do percurso havia grandes lojas de vários produtos, desde alimentação a automóveis. Sempre olhava com admiração e inquietude todas aquelas pessoas conversando com os vendedores, estes sempre com suas táticas miraculosas de convencimento apreendidas no Manual do Bom-Vendedor. Tudo lhe era estranho, parecia-lhe que os produtos com seus recursos e benefícios ofuscavam o contato humano. Sentia uma efemeridade naqueles contatos que eram projetados aos próprios produtos comercializados. No caminho sempre que cruzava com pessoas de branco tentava desviar o caminho. E nunca olhava diretamente nos olhos das pessoas que lhe apresentassem ares de desconfiança. Estava passando em frente a loja de vestuário quando avistou um homem de branco vindo a sua direção. Com um movimento rápido mudou para o outro lado da rua. Após o homem passar avistou um pequeno envelope caído ao chão. Normalmente não teria percebido. No entanto, a qualidade e o cuidado com que fora produzido chamaram sua atenção. Não lhe parecia um papel comum, destes de propaganda que normalmente infestam os centros comerciais. Abaixou-se e pegou com firmeza. Continuou andando e com ar desconfiado olhou para os lados e abriu o envelope. Nele havia um pequeno papel que estava escrito:

Roberto Fantine,
Eu sei. Entendo suas angústias. Venha me encontrar amanhã à meia-noite em frente ao cemitério. Não falte!
U.P.

Roberto entrou em pânico. O primeiro pensamento foi fugir e se esconder de todos, pois o remetente provavelmente estaria ainda por perto. Apressou o passo e ora ou outra olhava para trás para certificar se alguém o estava seguindo. Estava em direção a sua casa, mas pensou: “se eles me encontraram na rua, possivelmente me encontrarão em casa”. E continuou: “nenhum lugar está seguro!”. Mesmo com tal pensamento não encontrou outro lugar senão a casa. Correu. Morava sozinho em um pequeno apartamento alugado no 13º andar. Chegou ofegante. Entrou, trancou a porta, fechou as janelas e cortinas e tentou se acalmar. Seu coração palpitava de tal maneira que era possível escutá-lo. Passado alguns minutos após retomar a respiração começou a refletir nos escritos.

Eu também sei.
Sentiu pertencimento misturado com angústia, pois como ter certeza que ele realmente sabia. “Quem era ele?”, se indagou. Começou a pensar nas iniciais “U.P.”. “Quem poderia ser?”. Nada lhe vinha à mente. Não conseguiu encontrar nenhuma conexão com a realidade comum, a realidade que vários grupos pertencem sem estarem inseridos. Procurava nas inicias algo que lhe desse o tom de uma linguagem comum em que todos compartilhem, mas o intento foi interrompido com o bater na porta. Assustou-se e ficou esperando sem saber realmente se ouvira de fato o bater ou se era fruto de sua imaginação, de um estado de delírio. Queria confirmar deixando com que batessem novamente. Após alguns segundos as batidas foram repetidas. O estado de delírio se tornou uma realidade que o dava medo. “Quem será?”, pensou. Era quase 23h e não estava esperando ninguém. As batidas se repetiram agora com mais vigor. Pensou em ficar quieto na esperança que a pessoa desistisse e fosse embora, mas logo percebeu que a luz acessa o entregara. Guardou o bilhete no bolso e levantou-se do seu divã e foi atender. Olhou pelo olho mágico e viu que era um amigo que há meses não via. Jones, um amigo de faculdade que vez ou outra lhe fazia companhia em festas e bares que freqüentavam na época da faculdade. Jones sempre fora uma boa companhia nas horas de discussão sobre as relações pessoais e sobre filosofia ou economia política. Ficou ressabiado, mas abriu a porta. Ele estava com certo ar assustado. Usava um casaco preto surrado pelo tempo. Os olhos impacientes e a procura de algo que o detivesse a atenção, algo que lhe desse forças para continuar a falar.
- Olá, Jones! – disse Roberto tentando demonstrar admiração pela visita.
- Olá, Roberto, você está sozinho? – perguntou procurando enxergar alguém atrás de Roberto.
- Estou, mas porque está assustado? Entre, vamos. O que aconteceu? – perguntou Roberto.
- Ainda não sei exatamente.
- Acalme-se! – Roberto tentava dominar a situação para acalmar o amigo. Ofereceu-lhe o divã para sentar e se acomodou na poltrona localizada ao lado dele.
- Agora diga, o que está acontecendo?
- Veja! – Jones retirou um pequeno pedaço de papel do bolso e entregou ao amigo. Roberto ainda tentava controlar a situação. Até perceber que o papel parecia com o que encontrara há horas atrás. Cautelosamente começou a abri-lo. E assim o feito por inteiro, pôs-se a ler com atenção:

Jones Silva
Tenho algo que lhe interessa. Tudo irá mudar. Venha me encontrar hoje à meia-noite em frente ao cemitério. Não falte!
U. P.

Roberto não sabia o que dizer. Ficou em silêncio por alguns segundos, olhou para Jones com curiosidade e perplexidade. Jones continuava impaciente. Percebeu que o amigo terminara de ler e começou a explicar:
- O pior, meu amigo, ainda está por vir. Preciso lhe explicar como este pequeno bilhete chegou as minhas mãos. Há duas horas atrás, estava em um café com a Raquel conservando sobre nossos projetos. Ao fundo havia um senhor de meia idade tomando um café e lendo o jornal. Percebi que em alguns momentos parecia que nos vigiava. Não dei muita atenção, pois provavelmente tratava-se de minha imaginação. Continuamos conversando, foi quando a Raquel resolveu ir ao banheiro. Fiquei sentado revisando algumas anotações e concentrado. Passado alguns minutos percebi que o homem também foi ao banheiro. Continuei concentrado por mais alguns minutos e comecei a me preocupar com Raquel, pois estava demorando. Foi então que resolvi verificar se tinha acontecido algo. Fui até o banheiro e a chamei. Ninguém respondeu. Percebi que a porta estava entreaberta e entrei. Não havia ninguém, apenas este bilhete sobre a pia. Fiquei sem saber o que fazer. Foi quando pensei em você e corri para sua casa. E aqui estou.
Roberto fitou-o por alguns segundos sem saber o que dizer. Algo estava estranho em sua história. Ficou com receio de lhe mostrar o seu bilhete, pois assim o fazendo tornaria seu cúmplice de algo que ainda não conhecia em detalhes. Perguntou o que estava planejando fazer. Jones respondeu que não sabia, e que a visita tinha exatamente a intenção de pedir a opinião do amigo. Roberto então resolveu lhe mostrar o seu bilhete.
- É estranho Jones, coincidência ou não, eu também recebi um bilhete parecido. Veja!
Retirou-o do bolso e entregou. Enquanto Jones o lia Roberto explicava como o havia encontrado.

***

Ambos ficaram perplexos diante da situação. Não conseguiam entender o que estava acontecendo. Começaram a criar teorias conspiratórias, mas sempre havia algum furo na história. Eram poucas informações e as que tinham não faziam conexão umas com as outras. “E Raquel, onde será que está?”, questionou Roberto ao amigo. O fato era que já estava próximo à meia-noite, e Jones tinha que tomar uma decisão. Foi então que Roberto propôs que fosse ao encontro e que ele ficaria escondido observando. “E o que digo, o que faço?”, indagou Jones. Roberto apenas orientou que tentasse retirar todas as informações sobre o que estava acontecendo, principalmente, se a Raquel estava envolvida. Jones, mesmo aparentando insegurança, decidiu seguir o plano.
Jones foi à frente, enquanto Roberto o seguia, conforme o combinado. Quando chegou à porta do cemitério o portão estava entreaberto e havia um pequeno bilhete entre as barras de ferro e o muro. Jones o pegou nele havia escrito:

Jones Silva
Entre, siga uma quadra e vire à esquerda!
U.P.

Jones sem pensar muito resolveu entrar. Como sabia que havia apenas aquele portão, Roberto ficou esperando. Ao passar cinco minutos ele se preocupou com o pior e resolveu seguir o amigo. No entanto, assim que começou a sair do esconderijo um homem vestido com uma capa preta e um chapéu saiu pelo portão. Ficou na dúvida entre verificar se algo aconteceu ao amigo ou se seguia aquele ser estranho. Não demorou muito a decidir. Seu espírito heróico e todo o simbolismo que envolvia aquele homem fizeram com que tomasse a decisão de segui-lo. Estava com andar apressado e sempre olhava para os lados para conferir se alguém o estava seguindo. Como Roberto era muito discreto sempre conseguia esquivar-se de seus olhares desconfiados. Entrou em um casebre simples, cor laranja e com um singelo jardim com um corredor que levava à porta de entrada. No alto do telhado havia alguns pilares que provavelmente não serviam pra nada, coisas desses arquitetos que acreditam que o inútil é belo. Ficou esperando em torno de meia hora contemplando todos os detalhes da casa. Lá estava ele encantado com aquela casa. Conclusão! Resolveu entrar. Bateu antes, é claro. Quando a porta se abriu apareceu um homem alto, moreno e pediu para que entrasse. Ele tinha cara de poucas palavras, e realmente foram poucas as palavras que proferiu, mas com tão intensidade e objetividade que deixou Roberto tonto, simplesmente perguntou:
- Quem é o alvo?
- Como assim? Quem é o alvo? – questionou Roberto.
O silêncio tomou conta da sala. Ficou contemplando nosso amigo por alguns segundos, como tivesse o decorando. Olhou bem para os seus olhos e disse:
- Quem te mandou?
- Ninguém! Vim por conta própria – respondeu com medo da própria resposta. Foi então que Roberto percebeu aquele era um lugar que transpirava cheiro de morte. Não aquele ar nostálgico e tranqüilo presente nos cemitérios, mas algo revestido de terror e angústia. Roberto sentiu-se mal e a vontade de sair daquele lugar se intensificou de tal forma que tentou enganá-lo se explicando:
- Na verdade, eu gostei de sua casa, gostaria de saber quem foi o arquiteto – ”Idiota!”, pensou Roberto, “É claro que isso não foi uma boa explicação”, mas nesses momentos de pressão não conseguia elaborar grandes teorias sobre a psicologia humana e acabava sendo vítima dela mesma.
- Não sei – respondeu o estranho com voz seca e com um olhar de poucos amigos. Roberto até tentou verificar os outros cômodos da casa para ver se encontrava aquele homem que o fizera entrar naquela situação. Em vão, pois todas as portas estavam fechadas, e tudo ao redor era obscuro e indefinido para olhos distantes.
- Bom! Neste caso, vou embora – interpelou nosso herói.
Numa tentativa de fuga começou a se virar, quando o homem agarrou em seus braços, revirou-o e olhando atentamente nos seus olhos disse:
- Se contar a alguém do que ouviu, ou viu aqui, você será o alvo! Compreendeu?
- Sim claro! – é claro que havia entendido que ele estava ameaçando-o.
De repente, em um gesto ágil e preciso ele retirou a carteira do bolso de Roberto, abriu, verificou seus documentos e decorou seu nome. Naquele momento Roberto ficou gelado. Suas pernas bambas. Todas suas forças transformaram-se em fraqueza. Mesmo assim, buscou algo de seu interior que até o momento era desconhecido e frisou, com todo seu bom senso, que não contaria a ninguém. De fato, não pretendia contar isso a ninguém, exceto se as circunstâncias o forçassem.
Quando estava saindo da casa, embora confuso, sentiu um leve cheiro de perfume de mulher e avistou uma pequena porta que provavelmente dava para o subsolo. Aliás, a única coisa que conseguiu avistar na confusão das imagens que vieram à sua mente. Sua curiosidade foi maior. Sem muitos pormenores foi em direção à pequena porta. Assim que abriu Raquel estava sentada em uma cadeira e o homem de capa preta que o levou até ali estava em um canto do pequeno quarto de costas. Assim, que percebeu a porta se abrir viro-se para Roberto. Aquele homem de preto na verdade era seu amigo Jones. Não conseguiu disfarçar seu espanto ao vê-los. Até tentou dizer alguma coisa, mas as palavras não saiam de sua boca. Foi então que Jones tomou a iniciativa e começou a dissertar:
- Bem, não esperávamos que você nos encontrasse aqui. Mas já que isso aconteceu, teremos que te explicar algumas coisas. Sente-se, por favor – Jones foi pegar uma cadeira que estava ao fundo do cômodo. Raquel não olhava para Roberto. Estava de mãos cruzadas olhando para baixo. Jones abriu um pouco a roda e inseriu a cadeira entre eles. Roberto sentia que havia sido enganado, principalmente pelo amigo, sentou-se e perguntou com ar de irritação.:
- O que está acontecendo?
- Calma Roberto! – interpelou Raquel olhando em seus olhos. No mesmo instante Jones tomou a palavra:
- Vou tentar ser o mais direto o possível. Existem alguns procedimentos que tínhamos que seguir e você fazia parte de um deles. Não era nossa intenção te enganar, mas era preciso para que o plano desse certo. Não era para você nos encontrar. O plano era você se encontrar apenas com o Júlio – após uma pequena pausa Jones continuou: - Em maio de 2000, você me procurou para executar um plano seu. Não irá se lembrar porque logo depois foi para o médico e iniciou um tratamento com medicamentos que o fizeram esquecer ou transformar tudo em um pseudoilusão. Estava muito sério naquele dia e embora o plano fosse absurdo, esse tom me levou a segui-lo em frente. Você tinha quase tudo planejado, faltavam apenas alguns detalhes que seriam por minha conta. Na época você me ofereceu 500 mil reais para contratar um homem para te matar. E esse homem é aquele que está lá em cima. Tudo estava planejado para amanhã, conforme o combinado em seu bilhete.
Quando aquelas palavras foram proferidas, Roberto ficou em estado de semi- consciência. Começou a se lembrar de algumas coisas, mas ainda faltava algo para dar sentido em tudo aquilo. Lembrou-se do encontro com Jones, mas não recordou-se com detalhes da conversa, principalmente, do provável motivo que o levara a contratar o amigo para tal intento. Jones continuou lhe explicando. Disse que os bilhetes foi idéia dele e que todo o ar de mistério também. Depois de respirar fundo, Jones retomou a narrativa:
- Naquele fatídico dia, tentei lhe convencer do contrário, mas foi impossível. Pois você nunca me disse os reais motivos, então tudo que falava era como palavras ao vento. Confesso que não foi só pelo dinheiro que aceitei, mas no seu olhar havia algo de importante que merecia minha solidariedade. Confesso que também não segui a risca suas palavras, a Raquel não fazia parte dos planos, ela foi uma confidente de minhas angústias, não iria conseguir sem ela. Bom, aqui estamos nós. Júlio é o homem contratado para te matar, sua presença aqui foi apenas para ele te conhecer, detalhe que você fez questão de frisar quando me pediu ajuda.
Todas aquelas informações foram como um soco no estômago de Roberto. Tudo que sentiu naquele dia dois anos atrás, voltou como um raio que resplandece no céu em uma tempestade. Ficou tonto, ao ponto de quase desmaiar. Era preciso tomar uma decisão. Parar com o plano ou continuar como nada tivesse acontecido, o que seria quase impossível, pois a consciência traria uma dor pior que a própria morte. Tudo começou a fazer sentido, ou ter significado para ele. Suas neuroses, suas visitas ao médico. Eram apenas sinais de algo que seu subconsciente tinha ciência. Jones interrompeu seus pensamentos insistindo:
- Roberto! Temos que tomar uma decisão. Julio está lá em cima com a ordem de matá-lo. O que vamos fazer?
Para decidir era preciso relembrar o motivo. Embora Roberto sentisse toda angústia de um suicida, não tinha claro o motivo desses sentimentos. Era apenas um sentimento que o invadiu, sem razões, sem causas. Eram como formas sem conteúdo. Algo preestabelecido em sua mente, que de certa maneira conseguia controlar. Ficou por alguns instantes sem pensar em nada e em um suspiro lamentado declarou:
- Cancele tudo!
Jones sem muito questionar, abriu a porta e subiu as escadas. Roberto ficou a sós com Raquel. Era uma mulher com traços finos, cabelos longos e negros e olhar penetrante. Algo o deixou inquieto: percebeu que Raquel foi o detalhe que atrapalhou os planos. Um detalhe não planejado: uma mulher. Apenas sua existência na história de Jones fez com que suas ações não fossem previstas, ou pelo menos, parte delas. Levantou seus olhos para aquela mulher olhou dentro de seus olhos como pudesse ler sua alma. E percebeu que tudo até ali não era sua vida, apenas parte de um universo paralelo.

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